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28/07/2016

O Silêncio da Noite

Sssshhhhhhhh...

...O silêncio da noite vem chegando.
O meu peito rasgado, soturno e oprimido,
enfim, saciará o anseio pelo descanso.
O dia rasgou-me ao meio
e minh'alma encheu-se de espinhos
ao tempo em que me arrasto e vagueio
amargo e pávido em meus próprios caminhos.

Mas agora, ei de me acalmar,
minhas vísceras recebem aliviadas
o cheiro da noite que está por chegar.
Festa na floresta! Bruxas a cantar!

E nas ruas, a boemia de bar em bar.
E no meu quarto vazio e escuro
encontro na noite a mais bela amante
que sopra seus mistérios em meus conjuros,
para que as estrelas em perpétuo levante,
me envolvam em singelo, torpe e puro
descanso de mais um dia inquietante.

Sssshhhhhhh...

...o silêncio da noite vem chegando.


19/07/2016

Filho de Caim

Queria eu não ser
filho de Caim.
A marca na testa,
o pecado estampado
na alma.

[pecado é um anjo caído
no centro da cidade e
que dança
torpe e ensandecido
o jazz
nas noites
tristes e solitárias]

Pecado é desejar
suas curvas
enquanto tudo é proibido
num mundo onde
homens e mulheres
fingem entender
que o inevitável querer
pode anoitecer ou entardecer
dentro de um quarto escuro
e vazio de lembranças.

Queria poder caminhar
sem o peso do mundo
em minha alma.

Mas o mundo todo
serve para isso:
ser levado em viagens
que se findarão antes
mesmo da serpente
morder a própria cauda;

Em breve amanhecerei
e a cidade deixará de ser
soturna, então haverá
carros, pernas, bocas,
pássaros sujos em busca
de restos, crianças,
soldados e tudo, tudo o mais
que se possa caber
numa cidade -

A marca dormirá
em minha testa, eis
minha herança maldita,
minha decadência...
... mas o jazz...
...o pecado...
...as suas curvas...
me faz lembrar
que mais ao final do
dia, mais uma vez
despertará minha
atroz solidão.

São Gonçalo, 11/09/2014 (Bar Navegante)