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19/07/2016

Filho de Caim

Queria eu não ser
filho de Caim.
A marca na testa,
o pecado estampado
na alma.

[pecado é um anjo caído
no centro da cidade e
que dança
torpe e ensandecido
o jazz
nas noites
tristes e solitárias]

Pecado é desejar
suas curvas
enquanto tudo é proibido
num mundo onde
homens e mulheres
fingem entender
que o inevitável querer
pode anoitecer ou entardecer
dentro de um quarto escuro
e vazio de lembranças.

Queria poder caminhar
sem o peso do mundo
em minha alma.

Mas o mundo todo
serve para isso:
ser levado em viagens
que se findarão antes
mesmo da serpente
morder a própria cauda;

Em breve amanhecerei
e a cidade deixará de ser
soturna, então haverá
carros, pernas, bocas,
pássaros sujos em busca
de restos, crianças,
soldados e tudo, tudo o mais
que se possa caber
numa cidade -

A marca dormirá
em minha testa, eis
minha herança maldita,
minha decadência...
... mas o jazz...
...o pecado...
...as suas curvas...
me faz lembrar
que mais ao final do
dia, mais uma vez
despertará minha
atroz solidão.

São Gonçalo, 11/09/2014 (Bar Navegante) 

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