A videira está seca. Cospem na rua da amargura e o amargo já não é amargo, tem gosto de ferrugem. Hoje eu apertei a mão de alguém que era o inimigo. Ontem eu beijei o inconsciente mágico da indecência. Parte-se para um lugar oinde não se vê. Meu corpo físico, como uma folha seca, flutua no ar e sou levado ao céu e vejo que no céu não há nada além de lua, estrelas e cometas. Sonhos já não podem ser comprados. Vazio sóbrio entala no peito com a alma atravessada na garganta presa por um grito de outrora. E todos sorriem...
o hipócrita tem um jeito especial de sorrir, a puta tem um jeito especial de sorrir, a dona de casa tem um jeito especial de sorrir, a criança tem um jeito especial de sorrir, o cão ladra e a caravana passa, o agente funerário tem um jeito especial de sorrir, os inimigos sorriem diferente dos amigos (dependendo do contexto), o político tem um jeito especial de sorrir, o ladão sorri igual ao político e eu não sorrio, fico no canto esperando o carnaval passar...
A videira se despedaçou e foi levada pelo vento. As ruas vazias cheiram a sangue e a solidão. A noite se despede, o dia acorda com um rosto cinza e choroso. Já não quero mais o mel, vou de fel e conhaque de alcatrão. A calçada se lamenta o peso do bêbado. Pernas brancas, negras, amarelas, transparentes se cruzam na dicotomia sagrada do ir e do vir. A cidade acorda e sorri...
São Gonçalo, 16 de setembro de 2011.
...menos eu.
São Gonçalo, 16 de setembro de 2011.